Ao nascer, o pai de João-Sem-Nome decidiu por não dar nenhum nome á criança pequena e enrugada que ainda não parecia ninguém para ter um nome. Não se pode errar ao dar o nome a alguém, disse á mãe quando ele voltara do cartório com um espaço em branco na Certidão de Nascimento. Quando ele se parecer com alguém, damos um nome, argumentava ele enquanto a mãe amamentava o pequeno embrulho choroso.
E assim foi. Um mês se fora antes que a mulher voltasse á reclamar. Seu estoque de adjetivos e apelidos estava se esgotando e a cada visita de um parente, gastava horas justificando o porquê de seu filho não ter um nome. Daqui a pouco o dirão bastardo! Ou sabe-se lá o que esse povo é capaz de dizer. Dê um nome para o seu filho, homem, ou então eu mesma darei! Gritava a mulher ensandecida.
Porém, o pai afirmava que a criança ainda não tinha cara de ninguém. Não se parecia com José, Otávio ou Pedro. Andava pelas ruas pensando em nomes e ao conhecer alguém, tentava dar o nome do desconhecido á criança, mas o nome nunca parecia caber naquele corpo miúdo. E enquanto o filho aprendia a engatinhar, o pai perdia o sono pensando em nomes e concatenando variações. Essa criança tem cara de Letônio, pensava. Mas não queria que seu filho fosse confundido com nenhum país gelado.
Um ano se passou, o pequeno menino andava, corria, quebrava copos e a mãe já havia se acostumado a chamá-lo de qualquer outra coisa que não fosse um nome. Resignada, cansada de discutir, a pobre mulher aceitou a sandice de seu marido e achou melhor não piorar tudo. Melhor ficar calada, afinal, isso não podia durar para sempre.
Só que o menino aprendera a falar. Mas, mamãe, meu nome não é Filho, nem Amor, porque nunca me chamam pelo meu nome? choramingava o pequeno inutilmente, pois com os anos a mãe aprendera a transformar justificativas em verdades, e o que era mais importante na vida de um homem senão seus atos? ou então os feitos que faria no decorrer da vida? o nome de nada importava! E a essa altura do campeonato, a própria mulher não se importava mais, habituara-se a não precisar usar nomes, a definição que coubesse ao momento seria o nome provisório e a vida seguia em frente.
Se não importa vou me chamar Napoleão, resmungava o pequeno homem que repetia todos os nomes que lia nos livros da casa, tomando-os como seus por direito e protesto. E como continuaria a fazer, em vão, até o fim de sua insípida vida.
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