Doze girassóis numa jarra

31.7.13

tem o som da cor dos teus lábios. 

     Irônica é a forma com que um punhado de palavras aparentemente inócuas consegue ecoar de forma tão pungente e por um período tão longo de tempo, ao comparar com a fraca memória que ela costumava ter. Depois de relembrá-las, escrevê-las, ressignificá-las e as tantas outras coisas que tentara fazer com aquela frase incompleta à exaustão, pensava que elas haviam se misturado com a essência de seu próprio ser, e que mesmo sem querer, tinham se enraizado no canto mais profundo de sí, aflorando lírios desconhecidos e girassóis inexplicáveis.
       Depois delas, ela passara a andar sinestésica por aí, se distraindo com o barulho das cores, o cheiro dos sons. Um universo desconexo de rumos flutuantes. Tinha adquirido asco pelo estático. Derretia as horas, brincava com a sensação do toque do vento passando pela sua pele e quando se cansava da incoerência proposital do espaço a sua volta, escolhia o telhado mais alto e dormia coberta pelo lençol estrelado que costurava seus sonhos insólitos. Sentia-se em um quadro de Van Gogh, com suas pinceladas quase beirando ao absurdo. 
     Não tinha casa. Era só mais um corpo, vida efêmera, acontecimento aleatório, prestes á terminar e passar pela história sem deixar vestígios. Seu único rastro, a marca de sua passagem pelo mundo, era a marca de suas  pegadas na areia fina e branca da praia que correra dias atrás, enquanto observava o forte vento do entardecer dissolvê-las no tempo, durando um instante apenas, o suficiente para sua satisfação. Tinha toda a humanidade dentro de sí, sua vida passava pelo tempo de muitas vidas, era todos, era nenhum. Era vida e morte, seco e molhado, multicolorido e monocromático. Em seus ouvidos, todos os segredos do mundo eram soprados e por seus olhos todos os sorrisos que jamais tinham sido dados, passavam. A carne, orgânica, contrastava com a onda infinita que seus cabelos faziam ao tocarem a água. E dentro de sí, todos as suas células cantarolavam um sussurro unísono

O universo tem o som da cor dos teus lábios. 

2 barulhos :

{ TonyEspósito } at: 31.7.13 disse...

isso é maravilhoso, Dedessa. simplesmente tão sonhador. preciso aprender a escrever como você!

{ Carol da Matta } at: 1.8.13 disse...

Muito bonito, Andressa! Tantas imagens suscitadas que terminei por pintar um quadro...

Beijo!

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